terça-feira, 2 de abril de 2013

Capítolo I: Reprise Sentimental.

            Eram as férias de julho, eu tinha quinze anos. Como qualquer garoto ofuscado por uma vida no interior eu estava entediado demais para pensar em diversão. Até uma tia que morava na capital me fazer a incrível proposta que, aos meus olhos, era a melhor coisa que já havia acontecido: passar duas semanas de festa em sua casa. Ela estava casada com um cara novo a pouco tempo (que fique claro que na vida dela houve muitos caras novos) e dividia essa casa com ele, um professor de dança. Diga-se de passagem que festa era e ainda é uma palavra muito presente na vida dessa tia, o que me fez sonhar com o paraíso da vida noturna. Finalmente coloquei a mochila nas costas e parti, o bairro era de classe média e baixa com praças legais, o ambiente movimentado com um toque de subúrbio me deixou mais animado  e quando a noite chegou, aquilo que eu precisava ouvir: -Você não vai sair? Fazer amigos... tem muita menininha no bairro. Eu estava esperando por esse momento. Saí, vi muitos outros adolescentes na rua. Só sentei em um banco de parada de ônibus perto daquela rua com nome engraçado. Como uma rua pode se chamar Coronel Barata? Era só mais uma rua do bairro 13 de Maio. Queria um motivo, alguma situação que me obrigasse a falar com alguém, foi aí que surgiu a idéia dos fogos de artifício. Me levantei e me direcionei ao garoto que parecia mais aberto a amizades, não lembro seu nome e também nem poderia porque a cada cinco minutos ele me dizia um nome diferente, só lembro de seu cabelo meio comprido para o seu rosto pequeno, um cabelo ondulado e bem preto em contraste com a pele extremamente branca [rsrs]. O moleque era um desordeiro do bairro, ele não parava de falar e  fazer perguntas! Eu tinha acabado de fazer um novo amigo. E foi assim que seguiu todas as noites, durante o dia também. Tive a coragem de passear de bicicleta com um garoto que praticamente se jogava na frentes dos carros, foi o melhor passeio de bicicleta mesmo a parada sendo o cemitério do bairro, que era até bonito. Os dias se passaram rápidos demais, logo chegou minha última semana e então a última noite. Fomos até a praça, pouco movimentada, e mal iluminada... subimos em uma árvore e só esperamos o tempo passar enquanto vomitávamos todas aquelas besteiras de adolescentes. Estava nublado, fazia frio, também já era tarde e mesmo com alguém tão legal me senti assustado foi quando decidimos que era hora de voltar pra casa. Na caminhada era explícito a tristeza nos meus olhos, todo aquele mundo novo ficaria pra trás; -Tá frio! eu deixei escapar. -É! Movimentei as mãos tentando aquecê-las, o que não adiantou muito. Foi nesse momento, de mãos soltas, que senti um calor vindo de outro corpo, era sua mão segurando a minha, quase não segurando, com medo. Olhei para seus olhos, enquanto ele também olhava. Não durou três segundos. Talvez mais que isso até, soltamos a mão um do outro bruscamente depois do constrangimento chagar até a cabeça, além daquele pensamento: "Que gay!" Foi a coisa mais gay que já tinha feito na minha vida e por isso não falamos mais nada, até que cheguei em casa, abri o portão enquanto o olhava esperando um súbito movimento. Seus lábios se mexeram e ele disse que apareceria no outro dia. -Mas eu vou embora amanhã! -Bom, antes de ir eu venho me despedir. Até amanhã. -Até. Me senti um tanto feliz, aquela atitude não estragou o laço de amizade que havia formado durante as férias. Meu coração pulsava de uma forma estranha, cool. No outro dia pela manhã, eu o esperei ansiosamente, como aquela raposa em O Pequeno Príncipe, eu havia sido cativado. Mas ele não apareceu. Meus pais chegaram, eu fui embora e tratei de imortalizar as coisas boas que aconteceram, mas pouco me lembrava.  Um final de semana qualquer, com aquela reunião de família que temos todos os domingos, minha tia lembra de me dar um recado: - Ah, seu amiguinho chegou lá em casa pouco tempo depois pra se despedir. Ele mandou um abraço. Eu sorri, e nunca mais senti aquele sentimento de novo. Nem lembrei do garoto, não mais até o presente momento.